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2003

FÁBIO OLIVEIRA NUNES







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Como definir a web arte?

CONTINUAÇÃO


Abre-se um caminho em que o hipertexto – os links e seus infinitos percursos – se aproxima da chamada multimídia – imagem, som, texto e vídeo em um mesmo documento – formando-se a hipermídia . Os sites perdem, pouco a pouco, seu caráter mais textual e estático para se tornarem espaços dinâmicos repletos de recursos que criam interfaces mais amigáveis e mais ricas visualmente. A quase infinidade de recursos que esse tipo de software possibilita, por um lado cria a mesma fascinação que se faz diante dos recursos de editores de imagem, que ao toque de alguns botões, tornam a imagem original irreconhecível. Por conta da primazia técnica, muitas vezes, produções de design em hipermídia são consideradas – equivocadamente – de faturas artísticas.

É certo que por conta de ser um meio ainda sem paradigmas muito bem definidos como é a Internet, a fronteira entre uma e outra categoria – web arte e design – ainda está sendo elaborada. Parte dessa indefinição se dá pela pouca afinidade com trabalhos de arte que não se aplicam à venda ou divulgação de algum produto ou serviço. Embora o número de trabalhos com intuitos não-comercias – e principalmente, com graus de subjetividade que distanciam enormemente uma coisa da outra – seja cada vez maior, esta generalização ainda deve estar presente por algum tempo.

1.2 Web arte: Experimentações artísticas produzidas para a Internet

1.2.1 O universo da arte e novas mídias

Deixando de lado o substrato tecnológico da web arte, primeiramente é interessante considerar o contexto artístico em que se inserem estas produções em questão. Várias denominações, tais como: Arte e Tecnologia, Arte e Novos Meios, Arte e Novas Tecnologias, Arte e Novas Mídias e Arte Tecnológica, se aproximam ao determinar as experimentações artísticas realizadas em suportes eletroeletrônicos, digitais ou biotecnológicos. Sobre a criação em meios eletrônicos, PLAZA e TAVARES (1998:63) definem:
Nos processos criativos com estes meios, a qualidade é evidenciada como compromisso estabelecido entre a subjetividade daquele que inventa e as regras sintáticas inerentes aos programas por ele utilizados. Estas tecnologias, ao participarem deste tipo de criação, instituem-se como forma de expressão, manifestada pelo diálogo entre a materialidade do meio e o insight criativo. É a partir deste diálogo que se revelam as diferentes poéticas. Os meios eletrônicos, representados pelo hardware e pelo software, são responsáveis por amplificar as capacidades cognitivas – sensíveis e inteligíveis – do criador, caracterizando, portanto, uma prática fundada em um permanente diálogo entre o individual e o coletivo. Impõe-se ao artista novas regras, que dele exigem uma familiarização com os modelos tecnocientíficos em uma interligação de práticas e saberes (techné + logos) disposta em relações interdisciplinares.”

A prática da produção artística em novas mídias pressupõe um conhecimento prévio das tecnologias empregadas seja por parte do artista ou pela equipe interdisciplinar a qual participa. Embora aparentemente isso possa criar paralelos com a produção artística em suportes mais convencionais – toda técnica exige um conhecimento prévio – é certo que ao lidar com os novos meios, há a exigência de um conhecimento muito mais objetivo e específico. Além disso, o conhecimento técnico é um excelente aliado para desvelar a estrutura do meio em questão.

Voltando-se para as experimentações artísticas para a Internet, podemos localizá-las no interior de um dos campos da arte e novas mídias: a arte telemática – termo que une telecomunicações e informática – junto a outras experimentações com meios próximos como o fax, a Slow-Scan TV e as redes computacionais anteriores a popularização da Internet, como o videotexto. Porém, com a hibridização de conceitos, é possível encontrar trabalhos que partem de outras categorias, como a bio art ou a arte robótica que apropriam da estrutura e linguagem das redes.

1.2.2 Definindo Web Arte

Mantendo-se distante dos subjetivos conceitos que legitima o produto de um trabalho como arte, podemos então definir como web arte aquela produção que é pensada levando em consideração o campo de significados e as especificidades da Internet. Muitas vezes apresenta-se como um espaço pontual na rede mas também pode fazer referência a espaços físicos remotos. Diferentemente dos sites de divulgação, as chamadas galerias virtuais que utilizam a rede como “estrutura”, a web arte apresenta-se na rede como “obra”, conforme define Gilbertto PRADO (1997a):
Sites de realização de eventos e trabalhos na rede: Nos (...) grupos que citamos acima (sites de divulgação), as redes são sobretudo ‘estruturas’, nos dois grupos que se seguem elas intervêm mais como ‘obra’. Essa participação pode ser compartilhada diretamente com outros ou ser desencadeada a partir de dispositivos particularmente desenvolvidos e direcionados para esses eventos. Por esta classificação, não queremos dizer que os artistas sejam definidos por uma única forma de trabalhar como sua característica exclusiva. As diferentes aproximações artísticas de produção em rede não se excluem, elas são algumas vezes complementares e geralmente concomitantes.
a) Dispositivo: É uma estrutura em rede estendida em diferentes locais, onde o espectador e/ou artista agem – sem estar em contato com outras pessoas – diretamente sobre o dispositivo, para iniciar uma ação. O trabalho artístico se estabelece com o desencadear da ação que é proposta pelo artista, conceptor da ‘obra’ e que se inicia com a participação do espectador.
(...)
b) Interface de contato e partilha: Trata-se também de formações efêmeras de redes, mas nas quais os trabalhos existem somente e graças a diferentes participantes em locais diversos. Não é somente a noção de fronteira que é quebrada, mas também o desejo de estar ‘em relação’ com outros. As redes nesse caso são utilizadas sobretudo com a intenção de um trabalho coletivo e partilhado.

1.2.3 Efemeridades

A produção em web arte necessariamente está ligada ao campo de significações que a rede suscita e também as especificidades técnicas e conceituais que nela se inserem. Primeiramente, a produção em web arte é calcada na efemeridade: a tecnologia, em caráter de atualização permanente, a cada instante proporciona um número maior de possibilidades – e de problemas. A constante atualização de software e hardware cria uma gama gigantesca de máquinas conectadas a rede com diferentes características e embora haja muito de universal em todo o processo existente na Internet – da HTML aos protocolos utilizados entre os computadores – ao lidar com pormenores estéticos, torna-se impossível determinar com precisão, a visualização e funcionamento no computador visitante.

Diante das inúmeras características do computador visitante,o artista – levando em consideração as propriedades do seu trabalho – pode formatar a sua produção para um usuário médio ou mais comum, tendo muitas vezes que abrir mão de particularidades ou tecnologias que não seriam acessíveis para essa média de público ou então, simplesmente definir uma configuração a que se encaixe em seu projeto, sem fazer concessões. É bom salientar que estamos nos referindo a questões técnicas, sempre transitórias, o que pode interferir no acesso para um maior público somente por um curto espaço de tempo.

Ainda no campo das efemeridades, temos na rede o estabelecimento de um outro tempo: as informações envelhecem em grande rapidez. O novo pode se tornar antigo em poucos meses. Uma interessante metáfora a esse outro tempo dado no interior da rede é vista em “Cronofogia” (2002) de Kiko Goifman e Juradir Muller, onde foi criado um “relógio web”. O envelhecimento e morte de uma imagem – localizada no centro da página – são dados pela ação conjunta de usuários: é necessário um determinado número de cliques para a ação se consumir de fato. O tempo de sobrevivência é dado pela própria rede.

1.2.4 O tempo real

Por outro lado, o tempo das redes é o tempo real. Seja por meio do fluxo informacional incessante – lidando cada vez mais com um presente se tornando passado – seja pelo uso do tempo simultâneo, do tempo “ao vivo” – familiar denominação dada pela cultura televisiva. Vários artistas buscam explorar esta instância em suas experimentações, mas na rede – muito diferente da cultura broadcast – a transmissão em tempo real está muito mais relacionada com imagens de sistemas de vigilância, numa linguagem que abarca alguns aspectos da contemporaneidade.

Caça-fantasmas – O site GhostWatcher (1996) propõe aos corajosos internautas que se disponham a vasculhar os cantos do quarto de June Houston atrás de temíveis fantasmagorias. Daí, os mais valentes reportavam aquilo que foi visto – ou imaginado – pelas câmeras por ela, disponibilizadas. O site atualmente (em julho de 2005) está off-line.

 

Um trabalho muito conhecido – de uso de imagens em tempo real através de imagens estáticas é “Ghost Watcher” , onde a artista propõe aos visitantes que através das imagens de câmeras posicionadas debaixo de sua cama, elaborem relatórios sobre o que viram. Há várias câmeras distribuídas pelo espaço, podendo-se vigiar sob diversos ângulos.

Parte integrante da dissertação de mestrado "Web Arte no Brasil: algumas interfaces e poéticas no universo da rede Internet", realizada sob a orientação do Prof. Dr. Gilbertto Prado, na UNICAMP.
© Fábio Oliveira Nunes: entre em contato.

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